sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Tramita no ICMBio primeiro pedido de supressão de cavernas de alta relevância

Está em trâmite, no Instituto Chico Mendes (ICMBio), o primeiro pedido de supressão de cavernas de alta relevância com base nos critérios estabelecidos pela Instrução Normativa 02/09. O Instituto do Meio Ambiente (IMA), órgão ambiental do estado da Bahia, emitiu licença prévia para exploração de minério de ferro a ser efetuada pela Bahia Mineração. A proposta prevê o impacto direto em 10 cavidades naturais de alta importância e outras 15 de média – o que, de acordo com a nova legislação, só pode acontecer a partir de compensação ambiental.

Uma obra com essas características começou a se tornar viável no dia 7 de novembro de 2008, com o Decreto 6640/08, assinado pelo então ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc e o Presidente Lula, que abriu as portas do patrimônio espeleológico brasileiro para o avanço de empreendimentos. De acordo com o texto, as cavernas passariam a ser divididas em quatro categorias (Máxima, Alta, Média e Baixa Relevância), e apenas as de máxima permaneceriam integralmente protegidas.

No fim de 2009, a Bahia Mineração entrou com o pedido que agora está nas mãos do ICMBio. Isto acontece porque, embora o licenciamento ambiental seja predicado do Ibama e dos órgãos estaduais, o Decreto 6640 diz que uma Caverna de alta relevância só pode ser suprimida caso duas outras, de mesmo status, sejam conservadas na área do empreendimento. Mas, se elas não existirem em número suficiente, o ICMBio pode chegar a um acordo com a empresa pleiteante. As cavernas em questão ficam no município de Caitité.

"O que temos recomendado aos órgãos legisladores é que a regra e prioridade absoluta deve ser preservar duas grutas na mesma localidade. Ou seja, se um empreendimento desejar impactar cinco cavidades de alta relevância, outras dez precisam de conservação em caráter permanente. Supondo que o ambiente tenha apenas seis grutas neste status, então apenas duas podem ser impactadas. Que isto seja rigorosamente avaliado. Mas é claro que existem alguns problemas, e precisamos analisá-los", explica Jocy Cruz, chefe do Centro Nacional de Pequisa e Conservação de Cavernas (Cecav).

Como em Caitité não existem outras vinte cavernas de alta relevância a serem protegidas como compensação, o ICMBio entrou no circuito e analisou a proposta da Bahia Mineração. Após amplo estudo, a criação de uma unidade de conservação de proteção integral (provavelmente um Parque Nacional) foi proposta na região de São Desidério, também na Bahia. É lá onde fica a caverna Buraco do Inferno da Lagoa, listada pelo Cecav como uma das dez mais importantes do país e caracterizada como de máxima relevância– uma vez que possui, por exemplo, o maior lago subterrâneo nacional.

O chefe do Cecav diz que o Decreto 6640 os pegou de surpresa. Mas, uma vez publicado, era preciso elaborar uma Instrução Normativa com o máximo de rigor. "No entanto, sempre soubemos que o conhecimento científico atual sobre o patrimônio não é suficiente para responder a uma série de perguntas. Precisamos de maiores estudos para aumentar a confiabilidade. Mas desde agosto do ano passado promovemos discussões amplas para que, no prazo de dois anos de revisão da IN, possamos aprimorá-la", diz.

Enquanto Jocy afirma que a IN segue o princípio da precaução, o que minimiza os impactos do Decreto, Mylène Berbert-Born, espeleóloga com 25 anos de experiência, pensa justamente o contrário. "Ela foi lançada sem certificação prévia de sua viabilidade e eficácia, ou seja, não foi previamente testada para os diferentes cenários reais possíveis. Sua experimentação está ocorrendo na prática do licenciamento ambiental, em pleno exercício da decisão". Em vista disso, a espeleóloga conclui: "Se os critérios adotados não são seguros, tendo em vista o nível de complexidade envolvendo os sistemas cavernícolas, consequentemente a tomada de decisão é frágil, sujeita a erros. Tratando-se de erros que podem comprometer bens coletivos irrecuperáveis, a situação fere o princípio da precaução que rege a política ambiental".

A Bahia Mineração foi a primeira a entrar com o pedido de supressão, mas não a única. A nova legislação determina que os estudos para indicar o grau de cada caverna devem ser feitos pelas empresas que solicitem a licença ambiental e precisam analisar as características das grutas nas estações seca e úmida, o que demora um ano. A tendência é que, a partir de agora, o ICMBio tenha bastante trabalho pela frente nos acordos com os pleiteantes (há uma série de solicitações em análise em São Paulo e Minas Gerais).

Enquanto se autoriza a destruição de cavernas com base em uma norma que não foi previamente testada (vide artigos no Espeleo-tema) - a Ação contra o Decreto não tem previsão para ser julgada.

Com informações do portal O Eco e da Sociedade Brasileira de Espeleologia.

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